Aroldo Camelo de Melo
Nada nada me decifra o pergaminho amarrotado
esse palimpsesto sem principio sem lastro
algo se alastra rasgando vértebras escancarando
braços boca que se abre num nevoeiro sombrio
é tarde um grito se agiganta no silêncio um mar
as ondas com suas espumas turvas um suor gélido
percorre veias numa voragem apavorante
Alhures apenas um rosto ruminando ossos
um peito se contorcendo numa vertigem dilacerante
que fazer para desentranhar esse grito preso na laringe
que fazer para libertar esse cão danado latindo em
desespero dentro de mim?
Se apelo aos deuses siderais escuto o ribombar
de um silêncio pétreo um eclodir de hiatos
corrompendo a corola do vento o horizonte se fecha
e as nuvens galopam em busca de outros ares
será necessário singrar o espaço romper obstáculos
quebrar a inércia dos deuses de barro?
Onde estão as omoplatas de titânio
os crânios de aço escovado e toda aquela
parafernália de princípios dos quaseandróides
que não me socorrem neste instante
de putrefação das ideias?
É preciso que se rompa esse espaço essa barreira
para que o verde floresça nos campos e essa aridez
do tempo se consuma e liberte esses ares subversivos
e tudo encontre seu eixo e tudo encontre a liberdade
das gaivotas esvoaçantes
Escrevo meu grito preso entre meus lábios meu liberto desejo
de mostrar meu rosto sem máscara meu corpo despido,
mas como me libertar dessas amargas amarras
dessas hipócritas escritas dessas desditas de um tempo pífio?
Libertarei minha alma desses infortúnios
espalharei no universo meu grito insano
silenciarei os corvos que me rodeiam
e direi as pedras em seu silêncio enigmático
que a ruptura é iminente para que se corrija a assimetria
do vento do tempo e que seja morta a voracidade
dos que conspiram contra os que ainda se embriagam
da esperança da liberdade do amor entre os homens.
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