segunda-feira, 4 de abril de 2011

ILHA DE PEDRA

Aroldo Camelo de Melo


Meu corpo sem textura, aberto
é um deserto onde nada medra,
é uma pedra cujo interior
guarda vestígios de humano
segredos
desejos gravados.

Assim como um impulso um soluço
Um sopro
um rasgo
um raso de chão
é o meu coração desfolhado
desertificado
sem forças
disperso
apagado
inerte
anônimo
anômalo.

Disforme é meu rosto sem gosto
e essas pedras grafadas nos sulcos de pele
são marcas de um tempo
de sol causticante
de ventos ululantes
de noites de gafanhotos
aranhas
peçonhas
de luas medonhas.

E o que resta em meu peito é uma ardência
um fogo queimando
um tumulto
um vulto sem rosto
e o meu grito guardado
jaz apagado no recôncavo da laringe

tudo tudo me constringe os músculos
esfacelados
mutilados
e este silêncio crescente
sufoca-me a mente
e incontinente meu sangue gela
ao ver os olhos de um corvo
olhos redondos
hediondos
gigantes
que vão se aproximando com olhares medonhos
e meus ossos gritam sílabas inaudíveis
e o silêncio impera
e todos os cânticos foram sufocados.

Tudo é deserto e só se faz ouvir o vento
e seus uivos nas conchas informes;
sou exangue e minha mão em aceno
insulta o tempo
questiona o vento
que se furta de me apontar o porto
onde descarregar os destroços do meu descarrilado corpo.
Meu corpo é um deserto onde nada medra.
Ilha de pedra.

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